MINAS, O OVO E A GALINHA

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Minas, o ovo e a galinha
Fernando Massote 27/03/2009

Um amigo diz que nascer em Minas mais parece ser uma sina, um fado muito pesado. As “montanhas” barram tudo. Mais parecem uma muralha da china. O máximo que você pode fazer, aqui, é ruminar. Além disso ou melhor que isto, só cochichar. Pensar e falar são coisas proibidas. Até parece que o cochicho foi inventado e/ou nasceu em Minas, que foi inventado aqui para significar pensar e falar… Que tal a “omertà” siciliana?… Aqui, quem cochicha pensa estar falando. Sabemos que não é verdade, o cochicho é universal, mas que parece ser coisa mineira, ah, isto parece!…

Atenta melhor para o fato e verá que em todos os lugares, as pessoas, até cochichar, cochicham mais alto do que em Minas! Em Minas o cochicho é uma arte, ou melhor, a maior das artes. Mineiro acredita mais em assombrações que qualquer um. Está sempre na espreita desses seres, por definição, suspeitos.E com a maior razão: eles, afinal, são figuras incorpóreas que podem escutar tudo. Shii! Shiu! Psiu! Aqui, o dito universal de que “as paredes escutam” é mais digno de fé que “altrove”. “Vamos, por isto, dizer tudo baixinho, baixinho… sabendo, aliás, que o melhor mesmo, para não arriscar nada, é não dizer, nunca, nada, psiu!…”

Aqui, o que não é cochicho é censurado… Mas o cochicho já não é uma censura ou a pior das censuras? Afinal, o cochicho não é, já, uma palavra embrionária? Ou é até menos do que isto, ou seja, penas que uma intenção, sempre maligna… de falar? Falar, enfim, é coisa do demônio e deve mesmo ser proibida… shiu, psiu!…Ora, se o cochicho não é nem uma palavra, não expressa, pois, nunca, pensamento algum, porque, como dizem os filósofos da linguagem, sem palavra não há pensamento.

Em Minas tem pensamento? Será que os mineiros que fazem sucesso lá fora não são justamente os que sabem pensar e não podendo fazê-lo em Minas, conseguem a proeza de saltar as montanhas, falando, então, lá fora? Os que ficam em Minas são, portanto, os que não podem ou não conseguem pensar ou até que poderiam se conseguissem “saltar” as montanhas?

Será que não foi por isto que meu pai me ensinou, desde pequeno, uma lição genial: meu filho, ao caminhar, você deve olhar para os seis lados: prá frente, prá baixo, prá o alto, pros lados e prá trás. Será que assim se enxerga mais do que qualquer um, sendo treinado a olhar para as seis direções? Será que o mineiro é isto: enxerga mais, mas não pode dizer o que enxerga? Enxergar, enfim, não é mudar o jogo? Em Minas não podemos mudar o jogo.

Afinal, as assombrações existem mesmo ou é o próprio mineiro que as cria? Ora, mas isto não é a mesma coisa: os fantasmas existem ou os mineiros os criam? Onde está o ovo, onde a galinha? Em suma: há mesmo uma sina, a do cochicho? Se há, quem a cria? A geografia? Entramos aí num longo debate entre o determinismo (do meio geográfico sobre o pensamento) alemão do século XIX e o possibilismo francês dos anos 30 da mesma centúria. De novo o ovo e a galinha. Marx também colocou aí uma pitada sua, como sempre, dialética. A coisa aí ficou até feia: estrutura ou super-estrutura…? Quis, escreveu, debateu, mas não acalentou muitos e até hoje dá muito pano prá manga: afinal, o ovo ou a galinha?


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