Como pertenço àquela ala radicalmente oposta à religião e à crença no metafísico, vou me limitar a publicar aquilo de mais relevante e ponderado, que nestes últimos dias, andei lendo sobre o assunto. Faço isso para não polemizar, pois tenho baixa tolerância com a hipocrisia e pouco polimento com as palavras. Ademais, o caso da menina de Alagoinhas e os desdobramentos que se deram em Olinda e no Recife, para mim, foram por demais devastadores. Também tenho uma filha, adolescente, devo lembrá-los.
Pois bem, deixo para a reflexão de vocês a lambida que dei na boa abordagem do caso feita pelo Kennedy Alencar, mas, se for provocado, não hesitarei em dar uma boa resposta.
É justo questionar dogmas católicos
Kennedy Alencar - 07/03/2009
A Igreja Católica é composta por homens e mulheres de carne e osso. Como toda instituição viva, seus dogmas merecem contestação de quem pertence aos seus quadros, de quem já pertenceu e de que não pertence. Os de fora têm o direito de opinar sobre as decisões de uma instituição poderosa e que influencia o debate público no mundo inteiro.
No Brasil, há separação entre Estado e igreja. Apesar disso, os religiosos se julgam no direito de criticar decisões legais, como o aborto de uma criança de 9 anos que foi estuprada. Ora, se podem meter o bedelho nas regras do Estado laico e democrático, podem também ouvir críticas aos seus dogmas.
Nesse contexto, é absurda a excomunhão dos médicos e da mãe da menina estuprada pelo padrasto. Pior, o arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho, disse que aborto é pior do que estupro. Os idiotas da subjetividade vão dizer que é assunto da Igreja Católica e ponto final. No direito canônico, o aborto é mais grave que o estupro. Quem é católico que se acomode, e os incomodados que se retirem.
Esse discurso serve a um conservadorismo anacrônico que afasta cada vez mais a Igreja Católica do cotidiano de seus seguidores. É um erro considerar um meio católico ou um mau católico quem apoia a decisão de abortar nas circunstâncias em que se encontrava a menina de 9 anos. Ela pesa 30 quilos. Sua gravidez poderia matá-la. A lei brasileira permite aborto em caso de estupro e quando a vida da gestante está em risco.
Há outro agravante: a menina é de uma região pobre do Nordeste, na qual o peso dos valores religiosos é maior do que em outras partes do Brasil. Uma condenação da Igreja Católica soa a uma espécie de sentença de morte religiosa.
É uma pena que a Igreja Católica tenha abandonado a opção preferencial pelos pobres. O homem que deu início à caminhada dessa instituição milenar teria reparos a fazer à turma de Bento 16.
Mais debate
A briga é meio perdida, mas é preciso discutir a ampliação do direito ao aborto num país em que isso é questão de saúde pública. A mulher deve ter o direito de decisão. Legalizar mais amplamente o aborto, com limite até determinado tempo de gestação, não vai obrigar ninguém a tirar filho da barriga.
E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br
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