ESQUERDA EM DECANTAÇÃO

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EDITORIAL I: LACERDA NÃO GANHOU. O PT PERDEU
Geraldo Elísio escreve no "Novojornal". Prêmio Esso Regional de jornalismo,
passado e presente embasam as suas análises
Por Geraldo Elísio
“Em festa de jacu inhambu não entra” – Ditado popular brasileiro

Não quero entrar em juízo de valores, mas democraticamente deve-se reconhecer que quando o povo erra, erra no seu legítimo direito de errar e o resultado das urnas, gostemos ou não, queiramos ou não, tem de ser respeitado.

Se em cima de uma mesa for colocado um jarro com água, limão e açúcar e uma faca, em uma tarde de verão, torna-se bem fácil supor que em algum momento alguém poderá transformar o conjunto em uma limonada. Por outro lado, se em cima da mesma mesa for colocado um litro de azeite e outro de água, junto a um liquidificador é possível supor que alguém tente misturar os dois líquidos. Se acontecer, enquanto o liquidificador estiver em rotação haverá uma aparência de homogeneidade que tão logo cesse o movimento rotatório, propiciando à decantação, a água e o azeite naturalmente se mostrarão separados.

O preâmbulo vale pelo menos para uma tentativa lógica de explicação do resultado eleitoral envolvendo a disputa pela Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. O PT começou a perder a eleição do último domingo há quatros anos passados quando de forma surpreendente, depois de estar a 16 anos no poder, com boa avaliação popular, resolveu de livre e espontânea vontade entregar o Poder ao adversário, fato pelo menos para mim inédito. Ou melhor, um pouco antes, quando o PT caiu nas mãos de Fernando Pimentel, sem nenhum projeto partidário, apenas dono de ambições pessoais e de grupelhos a exemplo de tucanos transgênicos.

Por que isso ocorreu? Com a palavra o ex-prefeito e atual ministro Fernando Pimentel, o vice-prefeito Roberto Carvalho que aceitou compor a chapa com Márcio Lacerda, depois se rebelando e promovendo a resistência que resultou na disputada do último domingo e todos os petistas e até o PMDB envolvido na questão.

Porém, indaga-se, se Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rouseff não quisessem isto, teria ocorrido? Teriam naquele futuro pretérito Pimentel e Roberto Carvalho autonomia para entregar o poder a Márcio Lacerda, do PSB, beneficiando Aécio Neves, do PSDB?
Aliás, é de se lembrar que Lula nunca perdeu os laços de amizade com Walfrido dos Mares Guia, liderança proeminente do PSB de Márcio Lacerda. E a própria presidenta Dilma Rousseff, ao concorrer ao Palácio do Planalto, quando de uma de suas vindas a Belo Horizonte, estando no auge a Dilmazia, que dizem ser uma criação de Walfrido, ela própria propôs a troca do slogan para Anastadilma.

Com o passar do tempo o casamento perfeito foi se deteriorando até chegar ao divórcio, houve o lançamento da cruzada “Fora Lacerda” com algumas importantes lideranças intelectuais aderindo de pronto para capitular na reta final; o próprio Patrus Ananias chegou a ocupar uma assessoria ao lado do prefeito reeleito; o PC do B abriu via Jô Moraes apoio ao ex-inimigo para quase que imediatamente recuar; e a esses fatores somam-se outros igualmente significativos.

Inação do PMDB do vice de Patrus, Aloísio Vasconcelos, traições e omissões petistas entre os quais se destacam Caixeta, o próprio Fernando Pimentel, Virgílio Guimarães e outros. Mesmo Lula, ao vir a Belo Horizonte para participar da campanha de Patrus, nesse mesmo dia foi participar de um jantar em casa de Walfrido dos Mares Guia, teoricamente chefe de Márcio Lacerda. Claro, em política alta existem adversários não inimigos, mas a curiosidade vai muito além nesta intrigante aproximação de Lula com Walfrido. Por que isto ocorre? Responda quem souber. A própria Dilma ao ser fustigada por Aécio Neves aplicou o bateu levou, mas suponho que ela não supõe que o eleitor esqueceu que um dia ela recomendou a troca da Dilmazia pelo Anastadilma.

Não gosto de me enveredar pelo esporte que se um dia já foi a minha praia há muito deixou de ser. Mas isto equivale a um clássico Atlético e Cruzeiro onde, por razões inexplicáveis, Ronaldinho Gaúcho dispusesse o talento dele a favor da “Raposa” e Montillo, da mesma forma igualmente se utilizasse seu talento para beneficiar o “Galo”. Querer que os atleticanos e cruzeirenses entendam uma formulação absurda como esta é muito para a cabeça de qualquer um.

No caso da água, do limão, do açúcar e da faca não tem erro quanto a limonada, podendo haver variação quanto ao adocicada ou acidez do sabor. Mas no caso da água com o óleo é tão certo como dois e dois são quatro que os dois nunca irão de misturar.

Não me cabe ditar normas de comportamento político, mas tenho o dever de noticiar e comentar. O resultado da eleição para prefeito de Belo Horizonte pelo menos põe fim a uma pantomima partidária e ideológica: o PT daqui para a frente terá de ser o Partido dos Trabalhadores e os tucanos terão de ser o Partido da Social Democracia Brasileira. “La comédia é finita”.    

Este espaço é permanentemente aberto ao democrático direito de resposta a todas as pessoas e instituições aqui citadas.

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