Do ilustríssimo José de Itabira para o agora execrado José de Itajubá, uma cortesia do sempre solidário (até no câncer) Língua de Trapo.
JOSÉ
Carlos Drummond de Andrade
E agora, José?
A festa acabou, / a luz apagou, / o povo sumiu, / a noite esfriou, / e agora, José ? / e agora, você ? / você que é sem nome, / que zomba dos outros, / você que faz versos, / que ama protesta, / e agora, José ?
Está sem mulher, / está sem discurso, / está sem carinho, / já não pode beber, / já não pode fumar, / cuspir já não pode, / a noite esfriou, / o dia não veio, / o bonde não veio, / o riso não veio, não veio a utopia / e tudo acabou / e tudo fugiu / e tudo mofou, / e agora, José ?
E agora, José ? / Sua doce palavra, / seu instante de febre, / sua gula e jejum, / sua biblioteca, / sua lavra de ouro, / seu terno de vidro, / sua incoerência, / seu ódio - e agora ?
Com a chave na mão / quer abrir a porta, / não existe porta; / quer morrer no mar, / mas o mar secou; / quer ir para Minas, / Minas não há mais. / José, e agora ?
Se você gritasse, / se você gemesse, / se você tocasse / a valsa vienense, / se você dormisse, / se você cansasse, / se você morresse… / Mas você não morre, / você é duro, José !
Sozinho no escuro / qual bicho-do-mato, / sem teogonia, / sem parede nua / para se encostar, / sem cavalo preto / que fuja a galope, / você marcha, José ! / José, pra onde ?
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